quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Matérial de Consulta/tema: Participação politica da mulher








Mulheres no Brasil:
retrato atual da participação política
Aline Bruno Soares ¹

A participação das mulheres na política no Brasil ainda é muito tímida. Através do
Código Eleitoral Provisório de 1932, as mulheres brasileiras passaram a usufruir o
direito de votar em eleições nacionais. Contudo, o direito estava restrito àquelas casadas
que tinham autorização do marido, às viúvas e às solteiras que possuíam renda própria.
Ao contrário dos homens, o voto só passou a ser obrigatório para elas em 1946, com a
entrada em vigor da Constituição do mesmo ano. Lentamente a realidade foi se
modificando até que em 1982 o país passou a contar com uma mulher como Ministra de
Estado, Maria Esther Figueiredo Ferraz, no Ministério da Educação.
Hoje no Brasil tem uma democracia consolidada, cuja transição de um governante a outro acontece de forma pacífica, sem crises institucionais ou de legitimidade do sistema político.
No entanto, as desigualdades de tratamento e oportunidade entre homens e
mulheres ainda são evidentes e mostram que a realidade não é tão diferente hoje do que
era em décadas passadas.
Em relação ao mercado de trabalho, por exemplo, as mulheres atuam em praticamente
todos os setores, com grande participação na vida econômica do país. Todavia, elas tem
ocupado espaços considerados menos valorizados, cujo valor do salário, em termos
absolutos, é mais baixo que o dos homens. Segundo dados do Ministério do Trabalho,
em pesquisa realizada em 2006, mesmo as mulheres que possuem maior qualificação ou
desempenham o mesmo trabalho que os homens recebem em média 19% a menos do
valor do salário recebido por eles. Não há como negar que o trabalho desempenhado por
elas ainda é percebido socialmente como complementar ao do homem, ou mesmo
‘inferior’. Apesar disso, a perspectiva é positiva no que tange o avanço da igualdade
entre profissionais homens e mulheres no mercado de trabalho, visto que atualmente as
mulheres são maioria nas universidades e estão cada vez mais capacitadas e
reivindicando seus direitos.
No que diz respeito à violência contra as mulheres, criou-se em 2006 a Lei 11.340,
também conhecida como Lei Maria da Penha, a partir da pressão feminina por mais
rigor na punição dos agressores domésticos ou familiares, e por medidas de proteção e
assistência às vítimas. A cada 15 segundos uma mulher é espancada no Brasil por
alguém de seu círculo íntimo, o que evidencia o conservadorismo e a violência que
ainda imperam na dinâmica familiar brasileira no que diz respeito à inserção e
valorização das mulheres, enquanto cidadãs e sujeitas portadoras de diretos e deveres.
Embora exerçam atividades profissionais fora de casa, a cultura de segregação das
tarefas baseada em gênero manteve a responsabilidade dos cuidados com o processo de
criação dos filhos, organização das tarefas domésticas, atendimentos às necessidades
dos idosos e doentes da família com as mulheres. Nos últimos anos, entretanto, pode-se
observar que algumas mudanças têm gerado melhorias neste aspecto.

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¹Cientista Política. Coordenadora de Projetos Políticos da Fundação Konrad Adenauer no Brasil.

O novo Código Civil brasileiro, de 2002, legalizou a igualdade entre os cônjuges, de
maneira que o homem deixou de ser a maior autoridade do âmbito familiar. Legalmente,
a responsabilidade e as práticas da vida comum passaram a ser compartilhadas entre
ambos. Não obstante, o ambiente doméstico ainda precisa ser transformado,
considerando-se que, segundo dados do Instituto de Pesquisa e Estatística Aplicada do
governo federal (IPEA, 2008), as mulheres dedicam em média 28 horas por semana em
afazeres não-remunerados, especialmente o trabalho no âmbito doméstico, enquanto a
dedicação dos homens aos mesmos limita-se a, no máximo, 10 horas semanais. Para as
mulheres economicamente ativas, que tem 40 horas de trabalho remunerado, mais as 28
horas de trabalho doméstico para realizar, sobra pouco tempo para atividades de cunho
social, pessoal ou cultural. Atuar num setor considerado machista, patriarcal e restrito,
como a política, no escasso tempo livre, não parece ser uma opção interessante para a
maioria delas.
No âmbito político, foi criada a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres,
vinculada à Presidência da República, para orientar e garantir maior acesso das
mulheres às políticas públicas, promover atividades e fortalecer demandas femininas em
todas as instâncias governamentais. Embora as propostas apresentadas e defendidas pela
Secretaria sejam positivas e demonstrem a preocupação pela maior inserção das
mulheres, as práticas existentes estão sujeitas à lógica do poder político brasileiro. Com
isso, apresentam um posicionamento conservador, que mantêm a visão tradicional de
poder político como um ambiente de atuação do universo masculino.
Outra medida recente, cujos resultados até o momento são considerados insatisfatórios,
é a Lei 9.100, de 1995, também conhecida como Lei de Cotas. A proposta da Lei, após
sua reformulação (Lei 9.504/97), é que os partidos políticos destinem ao menos 30%
das vagas para candidaturas de cada sexo no processo eleitoral. Enquanto outros países
utilizaram este mecanismo e conseguiram modificar uma realidade de grande exclusão
para uma prática de inserção de mulheres na política, no Brasil a Lei não teve o efeito
esperado. Não há qualquer constrangimento ou punição do Tribunal Superior Eleitoral –
TSE – se os partidos não cumprirem a normativa. Além disso, se o objetivo fosse
realmente permitir a inserção de mais mulheres na política, no momento em que a Lei
estava sendo debatida e aprovada, não haveria aumento do número total de candidatos
que um partido pode apresentar no pleito eleitoral; o que diluiu ainda mais a entrada das
mulheres no processo. Para garantir uma maior participação das mulheres na política, a
lógica da Lei deveria ser de 30% de cada sexo como mínimo de acordo com o número
de vagas em disputa, e não de candidatos. Isso obrigaria os partidos políticos a
oferecerem estrutura e condições para a atuação das candidaturas femininas durante as
eleições, ou também favoreceria a inserção de nomes de mulheres para alternância de
sexo nas listas.
No quadro acima estão os dados sobre os candidatos às eleições do ano de 2006,
referentes às vagas para a Presidência da República, Governos estaduais, Senado
Federal, Câmara dos Deputados e Assembléias Legislativas dos estados. É possível
observar que em nenhum estado houve sequer o mínimo de 30% de mulheres entre os
candidatos ao pleito, o que quer dizer que os partidos políticos não obedeceram a Lei
em suas listas de candidaturas, que continua sendo encarada como uma obrigação legal
sem punição ou efetividade.
Um olhar mais apurado sobre a prática política brasileira mostrará uma situação
desalentadora: hoje são apenas 3 governadoras de estado; 2 ministras de Estado; 46
deputadas federais em um universo de 513 parlamentares (apenas 9%); e 11 senadoras,
no total de 81. No plano estadual, são 1.059 deputados estaduais no país, com
representação feminina de apenas 11,9%. No âmbito local a realidade não é diferente:
são 503 prefeitas, representando 9% dos 5.547 municípios; com 6.497 vereadoras, em
um universo de 51.909 vereadores eleitos em 2008.
No ritmo em que as mulheres têm conseguido atuar na política, o quadro mudará apenas
em algumas décadas. Lamentavelmente as mulheres não recebem financiamento
eleitoral dos partidos políticos e tem maior dificuldade para conseguir verbas para a
campanha eleitoral. O pensamento de que a ausência de mulheres na política é uma
responsabilidade (ou irresponsabilidade) das próprias mulheres torna o quadro geral da
cultura política ainda mais cruel com as brasileiras. Com tantos obstáculos pelo
caminho (desde as diferenças salariais e de jornada de trabalho; o cuidado com os
filhos, os doentes e os idosos da família, além da responsabilidade pelos afazeres
domésticos; as dificuldades de acesso ao poder; os vários preconceitos presentes na
cultura brasileira), muitas mulheres buscam atuar em redes de pressão políticas paralelas
às estruturas de poder formal. Assim como os jovens, elas dão preferência à atuação em
movimentos sociais, visto que são nestas organizações da sociedade civil, especialmente
no plano local, que as mulheres sentem maior conforto e conseguem retorno mais
rápido às suas demandas. Ali elas se percebem mais livres para apresentar seus
questionamentos, impor suas necessidades e exigir seus direitos.
Através das organizações sociais, algumas das demandas das mulheres são resolvidas,
sem ter que esperar os procedimentos políticos formais, percebidos como extremamente
morosos e limitados. Neste sentido, os dados sobre as mulheres no poder político
indicam que parte deste universo entra na política através dos trabalhos realizados à
frente de movimentos sociais. É no plano local que muitas delas defendem suas
bandeiras e, depois de se tornarem uma liderança no grupo que representam, sentem-se
mais preparadas para lidar com o processo eleitoral e os demais trâmites da política
formal. Elas percebem que, embora a política pareça ser a forma mais complicada e
lenta de se conseguir resolver os problemas da comunidade, o resultado obtido através
do processo político tende a ter uma efetividade e abrangência maior, com a
durabilidade do respaldo de leis ou políticas públicas apropriadas.
A dinâmica eleitoral brasileira é bastante complexa, e não há uma real preocupação com
as questões de gênero. Alguns pesquisadores, movimentos sociais pela igualdade de
gênero e lideranças políticas entendem que parte do Fundo Partidário, verba de
assistência aos partidos políticos, devia ser voltada exclusivamente à formação política
das mulheres e preparação de candidatas para o processo eleitoral. No entanto, as
pequenas iniciativas ainda são muito tímidas e não conseguiram transformar a realidade.
São necessárias ações, leis e políticas públicas afirmativas no sentido de obrigar os
partidos políticos a inserirem mulheres em seus quadros, além de oferecer condições
efetivas de sua participação nos processos eleitorais.
O fato de aumentarmos a quantidade de mulheres na política não implica em qualidade
e quantidade de políticas públicas voltadas às demandas femininas. Afinal, parte das
mulheres que participam do processo político são provenientes de famílias tradicionais e
aproveitam os votos do curral eleitoral e a liderança de seus maridos e pais políticos
para garantir a manutenção de seu grupo no poder. Os partidos políticos apóiam a
situação porque também são favorecidos, na medida em que tal estratégia ajuda a eleger
outros políticos, por causa do coeficiente eleitoral (BATISTA, 2008). Este tipo de
dinâmica tende a perpetuar a lógica patriarcal de acesso ao poder político.
Ainda hoje a cultura brasileira valoriza a prática patriarcal e entende o espaço público
como ambiente masculino, cujas práticas e condicionamentos culturais afastam as
mulheres da vida pública. Para piorar o quadro, a população considera que não há
interesse por parte dos políticos em resolver as questões importantes para a sociedade,
embora as pesquisas de opinião indiquem que grande parte da sociedade considera as
mulheres mais éticas e trabalhadoras que os homens. Mas como afirma a Juíza Maria
Berenice Dias (2004): “Não basta ser mulher para mudar a condição da mulher na
política. É preciso que a política seja vista pela ótica da mulher. Só assim haverá uma
inovação, e a participação feminina será uma conquista, não uma concessão.”
Isso
significa que há um longo caminho a percorrer até que as mulheres consigam espaço
para influenciar e participar efetivamente do processo decisório, seja na esfera
econômica, social ou política da realidade brasileira.

Fontes – sites pesquisados em junho de 2009:

DIAS, Maria Berenice. Conservando sobre a mulher e seus direitos. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2004.
http://www.scielo.br/pdf/ref/v9n1/8609.pdf
http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?id=9813
http://www.espacoacademico.com.br/037/37cferreira.htm
http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/article.php?storyid=4383
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2007/03/08/294842831.asp
http://www.cedeplar.ufmg.br/demografia/dissertacoes/1993/eleonora_cruz_santos.pdf
http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/pdf/081216_retrato_3_edicao.pdf
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u367001.shtml
http://www.mulheresnobrasil.org.br/pdf/PMB_Cap2.pdf
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-62762008000200004&script=sci_arttext
http://www.ie.ufrj.br/aparte/pdfs/mulheres_na_politica_reduzem_a_pobreza_jan08.pdf
http://200.130.7.5/spmu/docs/indic_sociais2007_mulher.pdf
http://www.sinsesp.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=74:novocodigo-
civil&catid=69:leg-geral&Itemid=28
http://www.fazendogenero8.ufsc.br/sts/ST29/Camilla_Lima_Batista_29.pdf
http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2009/06/22/que-esta-em-jogo-a-qualidade-dademocracia-
brasileira-756448237.asp







3 comentários:

  1. Caro leitor, como a resolução da tabela não ficou nítida, deixaremos o endereço da página que foi extraida:
    www.tse.gov.br/internet/eleicoes/estatistica2008.htm

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  2. Oba um blog de boa qualidade, contéudos bons, e é lógico só podia ser de Fátima Fonseca
    (marmotinha).

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  3. Firme e forte seguindo Fátima.

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